" Em verdade vos digo :
Seja a Alma grande ou pequena,
escute meu amigo!
Nem tudo vale a pena!"

(zé)

disciplina.

Se amar fosse intransitivo,
nos pouparia de suas concordâncias e subordinações.
e disciplino as minhas orações, coordenando-as para um pretérito imperfeito:
- Queria conjugá-lo mais facilmente. Amém
Mas, maldito seja, é transitivo direto.
(Carece ser complementado...)
E a história nos conta
que a biologia não nega:
Quando existe química
Nem a geografia o impede.

-Amar, verbo rebelde, carece sempre de impossibilidades.

Carta desnecessária (de/ para) um morto

Das flores, nenhuma fez sombra
nem sussurros, nem baques
das flores, só secas, livros em dois lados

Dos dias, só flores amareladas, murchas
é assim, de sombras peuqenas e espumas esvoaçantes
a vida foi se fazendo, tímida e lenta
antes da caçada...da rede da morte

Dos livros, só poucos eu li
só movimentaram minhas retinas
e um pouco de paz momentanea

Dos dias, todos foram iguais
apesar de estações diferentes
as vezes cantagalo, as vezes cinelândia

Dos amores eternos, poucos, efêmeros
murcharam tão rápido quanto nasceram
a eternidade do amor vem da sua condição frágil e mortal.

Dos desencantos, encantos mil
dos desamores, poesias, odes, sonetos
das pessoas, rostos, vozes, músicas, cheiros

Das garotas, movimentos leves, danças, quadris
cabelos nos rostos, entrega ao momento
suavidade que só tem no nada

E assim, quando a rede passar, pegando peixe grande e pequeno
vou lembrar, que não tinha nada pra esquecer
o adeus é a Deus...E o sofrimento fica pra quem fica
não é que eu seja egoista, é que a vida passa e a rede chega
prá lugar melhor ou pior, eu vou do mesmo jeito
quem fica, chora,tem saudade, é o jeito...mas meu nome vai sumir
na noite do tempo, todo nome some, vai sussurar lá longe, no fim do mar...

E quando chegar a noite da vida
vai ser bom saber que houveram flores, sem sombra
poucos livros sem importância
dias tediosos, cantagalos, cinelândias
infinitos amores que morrem rápido
Houveram até sonetos!
danças, garotas, momentos sem a mínima relevancia.

Pois da vida, na fica, nada vai, tudo se evapora
e não adianta fazer e acontecer
Somos sombras e pó, que andam por aí dizendo que são coisas divinas
Valeu a pena? Algumas coisas valem...outras não
Pessoa estava errado?
- Qual poeta está certo?
"Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio"
E no fim (demoro a chegar a conclusão, talvez pelo medo que a conclusão das coisas traz aos homens, talvez por pura leviandade.)
lembrarei de mim, como sou, fui e serei...Pagão triste sim; mas sem fazer questão das flores no regaço.




Para meu querido amigo:
Ricardo Reis.

Das quatro precisões de viver

-Do que você precisa para viver? Perguntou assim, como quem se assusta.

- Amor de muito, sede de tudo, vida de graça, pão e cachaça.

Riu alto, olhou-me devagar e viu que era sincero... Olhou nos meus olhos quase ferindo as retinas:

- Acho que eu também. Falou do jeito de quem descobre um segredo, ou uma resposta que a muito tempo queria ter.
Beijou-me com firmeza, borrando o batóm.
Levantou, apagou o cigarro e saiu pela porta do bar.
Foi viver...
Nunca mais a vi.

Pagã

E havia tensão no ar
Pesado e quente, como o silêncio
leveza sadia do vazio.
olhos, olhares, pernas, pesares...
vadio, com o mesmo casaco de lã
olhava, cigarro na boca
(cigarro de rancor tem gosto amargo)
cerveja na boca, cachaça na boca
poesia na boca.
dançava, pagã como um seio descoberto
como uma fogueira, dançava
saia rodada, rodava meu mundo na beira do teu umbigo
dançava feito balão no ar
arte criminal, pagã por coerção
por decisão alheia...vagava no salão vazio
e eu, vadio, cabeça rodando, rodopiando
sentia a leveza e o doce de tuas coxas brancas, rodando
teu cabelo na cara, entregue ao momento
momento vazio, impregnado da tensão quente e vazia do
silencio
deitaria em teus seios pagãos
teu ventre sagrado
e esperaria, nascer um dia em que o mar, e a imensidão
estivesse na cor de seus olhos,
Jóias castanhas e tristes
pagãos como um corpo de mulher
como a leveza urgente e profana do viver
pagã e triste como o nada.





Cor-de-preto



Menina branca
com as cores d'OPovo no pulso,
não me é insulto,
Moça de cera
quer ser o que discrimina,
será baixa auto-estima?
Moça dos olhos d'água
que ri do meu cabelo
do chinelo
e que zomba do couro escuro
que é belo!
é estranho zombar do meu mundo
e no seu pulso
Verde-vermelho-amarelo.

(Zé Gabriel F.)



As cores verde, amarelo (ouro) e vermelho, são as cores da bandeira etíope. Elas são o símbolo do movimento rastafári, e da lealdade dos rastas à Etiópia e a África acima de qualquer outra nação moderna onde eles possivelmente vivem. Também são as cores 'd'O Povo',da União Africana.

Loas às quimeras.[Elogio ao sonho]

Quimeras¹ nossas.
Levianas, não se farão concretas, serão como o mar, que é infinito. Mesmo que te banhes nas vagas, as imensidades lhe serão alheias.
Mesquinhas, corroerão teus desejos, para que do teu banzo, possam eclodir novos ovos de novas quimeras. Propagam-se nas feridas que outras antes fizeram.
Ademais, serão teu ópio, teu baluarte, teu sangue e carne e santo graal.
Estarão toda a tua vida contigo.
De tuas quimeras ancestrais e mesquinhas,no fim, não cora de ombrear-te a única mais egoista e autruísta: A do sonho de amor.
Esta te velará no leito de morte, te levará para além do vau mundo, além da orbe celeste.
Mesmo que seja pó, ou cinza fumegante, esta [que tampouco torna-se concreta, assim como suas irmãs] estará contigo e estará em ti.

De carbono e quimeras, somos feitos... Navegantes do impossível sem saber que é, do alheio sem o ver, do imponderável sem ponderar. Não temos escolhas mais rasoáveis:

-Sonhemos.

(João do Mar)

¹A palavra quimera, por derivação de sentido, significa também o produto da imaginação, um sonho ou fantasia utópica